Cinco de abril... Domingo.
Já sem a sonda, levamos o meu pai para a sua chácara, que fica no pequeno município de Cristais Paulista, a uns vinte quilômetros da nossa casa... Ela já foi muito maior, mas ainda hoje é suficiente para as nossas reuniões semanais, que, sagradamente, acontecem aos domingos.
A nossa relação com a natureza sempre foi muito grande.
Sempre gostei de trabalhar na horta... Já a minha mãe tem predileção pelo jardim e El Cid era apaixonado pelo pomar. Para quem conhece o trabalho na roça, sabe que são lugares bem distintos, com tratos diferentes.
Entendi bem estas preferências, através de uma alegoria...
Ao trabalhar na horta, eu tinha uma grande preocupação em levantar bem o canteiro para evitar que a água retirasse parte do solo e sempre antes de plantar eu afofava muito bem a terra, colocando muito, muito esterco. Depois de jogar água nele, o cobria com folhas de palmeira ou bananeira, para manter a terra úmida e evitar a sua laterização... Fazia, então o plantio, geralmente com mudinhas que eu já havia semeado anteriormente em uma bandeja, com composto fértil, sendo escolhidas somente aquelas que eu achava mais resistentes e vistosas.
Com o passar do tempo nasciam muitas ervas daninhas, ao lado das plantinhas, então era o momento de me acocorar e, com as mãos, arrancar uma a uma estas invasoras, pois poderiam consumir parte dos nutrientes fundamentais para o bom desenvolvimento das "minhas plantinhas". Eu fazia até mesmo uma proteção com paus para evitar a visita de pássaros e uma calda com fumo, que jogava sobre as mudinhas para coibir o ataque de insetos e pulgões.
Ao associar essa minha preferência pela horta, com a minha vida, consegui perceber que eu tinha uma grande facilidade em cultivar novas amizades, principalmente nos meus locais de convivência diária, como no meu local de trabalho, ou nas minhas viagens. Eu preparava bem o terreno, "escolhia" as pessoas que tinha mais afinidade e retirava da minha convivência algumas "ervas daninhas", espantando também outros males que poderiam prejudicar aquelas amizades que eu cuidava com tanto carinho.
Mas, era na realidade, a mesma coisa que a minha horta, já que estas amizades duravam o tempo que nós convivíamos na escola ou nos outros lugares, já que o ciclo da vida das hortaliças também é muio curto, resultando sempre na renovação dos canteiros.
Percebi que, quando deixava de conviver diariamente com essas pessoas (o mesmo cuidado diário que a horticultura exige), a nossa amizade esfriava e, com o tempo, se acabava.
Procurei, então, entender o porquê do meu pai preferir o pomar, já que sempre ele dizia que "o que estava plantado ali", durava vários anos (algumas árvores "duram mais que uma vida", existindo por duas, três ou mais gerações) e, mesmo quando estamos distantes, elas são tão sólidas e resistentes, que conseguem sobreviver sem os cuidados diários que uma horta exige. Resistem à secas muito prolongadas e até mesmo a grandes intempéries ou tempestades. Lembro-me de um abacateiro, cultivado há muito tempo que, numa tempestade de verão foi atingido por um raio e quebrou-se ao meio, pegando fogo também. Eu queria cortá-lo, mas o meu pai disse que ele era tão resistente, que brotaria novamente com mais força ainda.
Impressiona-me muito, olhar para aquela árvore que, para mim tinha morrido e, hoje, vê-la vigorosa, frutificada, com galhos novos saindo da antiga estrutura danificada, Como algumas amizades que deveriam resistir a tudo.
Na minha horta, as frágeis plantinhas (entenda como as "frágeis amizades"), não resistiriam sequer a uma ventania, quanto mais a uma tempestade. O abacateiro do meu pai renasceu, como algumas amizades sólidas, que passam por intempéries e ressurgem, ainda mais fortalecidas.
Bom, continuo cultivando a "minha horta", mas tenho tentado plantar alguns abacateiros, no pomar das minhas relações. Espero que eu tenha a competência do meu pai, para fazê-los fortes e resistentes e, mesmo distantes, possam manter-se vivos e bem frutificados.
Eu sou, e sempre serei, mais um horticultor do que um fruticultor, mas vou tentar florescer os "meus abacateiros", pois só assim terei certeza que ficarão resistentes a muitas tempestades ou a uma grande distância, já que as suas raízes longas conseguem buscar água em grandes profundidades, não necessitando de regar-se diariamente.
E tenho certeza que o meu maior amigo foi, e sempre será o meu pai, El Cid.
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