Via Franca

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quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

"A visita da velha senhora", no Teatro do Sesi


Ontem fui conferir no Teatro do Sesi, lá na avenida Paulista, a encenação bem humorada (e com boas reflexões) da peça "A visita da velha senhora" de Friedrich Dürrenmatt, que é descrito pelo diretor desta montagem aqui no Brasil, Luiz Villaça como "um mestre inquieto, mestre em dramaturgia, mestre no humor, mestre em causar incômodo, onde cada linha do texto nos diverte, faz sentido em nossos dias e nos atira num paredão de sentimentos..."
Com um time respeitável de atores já muito consagrados nos palcos brasileiros, tem no elenco a irriquieta Denise Fraga (a sua atuação sempre me impressiona), Tuca Andrada, Ary França (com a mesma intensidade que tinha nos tempos do Ornitorrinco), Fábio Herford, que representa o prefeito e que nos ciceroneia na entrada do teatro, agindo como um bom político populista, David Taiyu (que representa cinco personagens diferentes, fato comum na peça), Maristela Chelala, Romis Ferreira, Edurado Estrela, Beto Matos, Renato Caldas, luiz Ramalho e Rafael Faustino.
O figurino vale um parágrafo à parte, rsrs... Como vários atores trocam de personagem todo o tempo, as trocas de roupa também são muito comuns. Inclusive, parte delas acontecem no próprio palco, já que compõem a cenografia (que também é bem interessante), espalhadas em uma arara no fundo do palco. Tirando os exageros de detalhes e cores da personagem principal, que é bilionária e bem kitsch, são rotas e apagadas, com uma pegada bem vintage (parecem ter saído de um brechó). Fiquei maravilhado com algumas peças e também adorei os seus desenhos no catálogo que é distribuído na entrada do público pelas mãos dos atores (muito comum nas peças da Denise).

A história escrita em 1955, mas extremamente atual, narra a visita de uma multimilionária à sua terra natal, Güllen, um pequeno e falido povoado na Alemanha, que conta com a benevolência da "sua filha mais ilustre" para que possa reexistir economicamente e socialmente... Eles esperam uma super doação financeira para reestruturar a pequena cidade. Mas, para surpresa geral, a "velha senhora" só vai liberar o dote de um bilhão (metade para a prefeitura e a outra metade para ser dividida por cada família) se o seu antigo namorado, que a abandonou bem jovem e grávida, for assassinado. A princípio, óbvio, a proposta é negada unanimemente pelos seus moradores, já que Alfred Krank, o alvo hipotético, é uma figura querida pelos mesmos. Mas, ao decidir-se ficar hospedada na cidade com o seu séquito, a senhora em questão, Claire Zahanassian (a outrora desprezada Clarinha) força os cidadãos a repensarem a sua posição. A partir daí uma sequência tragicômica toma conta das cenas, já que Güllen começa a enxergar a situação com "outros olhos", expondo ao máximo a fragilidade moral dos seres humanos quando o assunto é dinheiro. A cidade cumprirá o desejo de vingança da multimilionária (enxergando como "justiça")? Ou seguirá com os princípios éticos e morais da sua primeira decisão ("humanismo" nas palavras do professor do ginásio)? O dinheiro prevalecerá sobre a ética?

Fantástica abordagem, que me fez refletir sobre o cenário atual (e antigo também, rsrs) do nosso país, onde somos regidos por grupos que tem interesses bem claros e tem na arte da manipulação (associada à fragilidade das nossas virtudes) uma forma de nos enquadrar.
Reproduzo aqui um trecho do texto escrito pela Denise Fraga retirado do libreto da peça que achei bem interessante... "Uma obra prima da dramaturgia que, com humor e ironia, vai pouco a pouco escancarando a nossa hipocrisia e fragilidade diante do grande regente de nossas vidas: o dinheiro. que espécie de gente somos nós? Até onde nos vendemos para poder comprar? Como nos manter fiéis a nós mesmos nesta sociedade que inventamos viver onde o que vale é o que rende? Uma sociedade que cria monstros corrompidos pela ganância, que se tornam capazes até de travestir os seus interesses em discursos de amor ao próximo. Que tempos esquisitos estamos vivendo! Como manter viva a nossa esperança?"
Como disse, no início, vale a pena conferir... E é de graça! Há sempre uma retirada pequena de ingressos na bilheteria (geralmente uns cinquenta lugares) no dia da apresentação, mas o grosso dos convites é distribuído mediante um cadastro no site do Sesi, com direito a duas entradas por CPF (www.sesisp.org.br/meu-sesi).
As apresentações são de quarta a sábado, às 20h, e domingo às 19h. São 120 minutos de peça e é recomendada para maiores de 10 anos.
Ah, e vai até o dia 18 de fevereiro.

Serviço:
Teatro do Sesi (prédio da Fiesp)
Av. Paulista, 1313, na saída do metrô Trianon-Masp - São Paulo (SP)
Fone: 0800 55 1000 ou www.centroculturalfiesp.com.br
Reservas para grupos de Ongs, associações, Escolas, etc, ligue no (11) 3346-7439

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